terça-feira, 1 de agosto de 2017

“Cuidado!”, é o recado de ex-servidor que aderiu a PDV em 1999

Na entrevista abaixo Rubem da Silva, 54 anos, ex-servidor da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), conta sua história de como foi viver o “canto da sereia” da adesão ao Plano de Demissão Voluntária (PDV). Eram os anos 90 e o governo neoliberal de FHC anunciava que “o bom era ser seu próprio patrão, demitir seu chefe!”. Rubem e um outro colega tentaram. Receberam uma indenização e promessas de acompanhamento no novo negócio, só promessas. Depois de cinco anos o restaurante não deu certo e ele se viu na busca de uma nova oportunidade em um mercado preconceituoso, com filhos para criar e a incerteza da aposentadoria. Tempos difíceis!
Se pudesse, voltaria ao serviço público. Perguntado sobre essa nova rodada de PDVs anunciada pelo governo golpista Temer e qual sugestão daria aos servidores públicos, não tem dúvida: “Eu recomendo que pensem e se informem bem, porque nem tudo que está ali foi cumprido com a gente. É séria a coisa, tem muita armadilha. Cuidado, cuidado mesmo!”.
  
SINTRASEF – Em que ano o senhor ingressou no seu órgão?
RUBEM DA SILVA -  Entrei em maio de 1987, na área administrativa, na função de combate a incêndio da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen).

O senhor se lembra quando ouviu falar pela primeira vez em Plano de Demissão Voluntária (PDV)?
Foi no nosso setor, em 1999. Havia um comentário sobre um plano de demissão voluntária. Aí eu fui me informar e me explicaram um pouco. Eu não entendi muito bem, mas estava com intenção de ir para Rio Bonito (RJ) e montar um negócio lá. Aí recebi uma cartilha que nos dava certa segurança. Dizia que quem quisesse montar um negócio teria ajuda do Sebrae e do Banco do Brasil. Aquilo me animou e eu e um amigo do meu próprio setor fizemos.

O senhor lembra o que a cartilha dizia, o que o senhor assinou, qual foram as condições da sua saída e o que o senhor levou?   
Não lembro, faz muito tempo. O que ficou enfatizado foi que se montássemos um negócio teríamos esse acompanhamento com cursos e um banco do Sebrae até caminharmos com nossas próprias pernas no novo negócio, e que teríamos uma linha de crédito no Banco do Brasil. Aí animamos e fomos.

E como aconteceu, vocês receberam uma quantia e o crédito?
Recebemos o combinado, uma quantia como indenização, acho que uns R$ 25 mil, e fomos abrir o negócio. Quando montamos o restaurante e depois de uns três anos tivemos uma queda porque não tínhamos capital de giro e venderam o pátio ao lado que servia como estacionamento, fomos procurar o Sebrae, e aí não tinha nada de banco Sebrae nem curso para aperfeiçoamento. Era só aquela indenização que tínhamos recebido e acabou.

O senhor sentia falta do seu trabalho na Cnen? Além da mudança financeira, como foi a mudança de hábitos como trabalho, dia a dia, outras responsabilidades e tarefas que você não estava acostumado?
É uma mudança grande. Principalmente depois da queda do negócio. O restaurante durou uns cinco anos e tive que fechar. É um baque na família. Meus filhos acostumados com um padrão de colégio, médicos... e aí eu tive reacostumar e sobreviver em outra realidade.
Tem o preconceito no mercado também. Eu já estava com 35 anos e ninguém te dá uma oportunidade. Colocava currículo no mercado e nada. Um ano, dois anos tentando algo e não conseguia nada. Cuidado, o preconceito é muito grande!

O senhor procurou o seu órgão de volta? Quando o senhor fez o PDV tinha alguma cláusula que permitia voltar ao serviço público?
Não tinha. Se saísse não podia mais voltar. Tenho muitos amigos que saíram de outros órgãos, não deram certo e acabaram embaixo da ponte, viciados, sem famílias. Outros se mataram. Conheço uns dois que se jogaram da ponte.
Tem que estar com a cabeça firme para aguentar essa barra. A indenização que você recebe em um PDV acaba. Tem que lidar com uma nova realidade e muitos não sabem viver fora do órgão público, se adaptar a outro trabalho, abrir um negócio. Quando a ficha cai a pessoa endoida.
Tem muita gente que não consegue voltar aos seus órgãos nem para visitar, rever os colegas. Porque tem muita crítica, pessoal fala, tipo, ‘você é maluco. Olha o que você fez ao largar esse emprego’. E isso abate as pessoas, aí elas nunca mais voltam ao órgão.    

O quê o senhor faz hoje?
Desde 2005 eu trabalho com empréstimo consignado. E faço muitos empréstimos para pedevistas. Eu conheço a situação deles, não é mole não. A maioria não gostou do PDV.

Se pudesse, o senhor voltaria ao serviço público?
Voltaria. Até para se aposentar com um salário melhor. Vejo muitos amigos da minha idade já quase aposentados hoje e eu ainda estou por aí. Eu sei que existem tentativas, projetos lá em Brasília pela volta dos pedevistas. Só que agora com essa bagunça deste governo soube que parece que está tudo parado sobre isso. 

Como o senhor vê essa proposta do governo de um novo PDV?
Olha, eu acho que a pessoa tem que pensar muito, porque é difícil. Quando cai a ficha da nova realidade após o serviço público a pessoa se prejudica muito. Os obstáculos aqui fora são muito grandes, sem garantias tipo plano de saúde, férias e aposentadoria. O que passei, inclusive com filhos pequenos, foi muito difícil.

Eu recomendo que pensem e se informem bem, porque nem tudo que está ali foi cumprido com a gente. É séria a coisa, tem muita armadilha. Cuidado, cuidado mesmo! 
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