A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado
aprovou, por 16 votos a nove, o relatório do senador Romero Jucá (PMDB-RR)
favorável à reforma trabalhista, batizada de Projeto de Lei da Câmara (PLC)
38/2017. A votação se deu no final da noite dessa quarta-feira (28), após horas
de intensa troca de farpas entre base aliada e oposição e sem a participação de
segmentos populares, que foram impedidos de acompanhar a votação de dentro da
Casa. A matéria precisa agora ser apreciada pelo plenário do Senado, onde pode
ser votada teoricamente já nesta quinta-feira (29), mas deve realmente ser
votada na próxima semana.
Apesar dos inflamados protestos populares contra a
matéria, o placar confirma o cenário que tem se desenhado na Casa, com a
oposição ainda bastante sufocada pelos aliados do Planalto. Como resultado,
após a votação, os parlamentares contrários ao governo golpista de Michel Temer
(PMDB) reforçaram o apelo para que os trabalhadores participem da Greve Geral
marcada para esta sexta-feira (30), em todo o país.
"A população precisa dar um grito do Brasil
contra as reformas", disse Paulo Paim (PT-RS), depois de uma sessão de
quase 13 horas de duração e marcada na maior parte do tempo pelo esvaziamento.
O processo de votação na CCJ ocorreu por votação
nominal, com votos favoráveis de parlamentares de legendas como PSDB, DEM, PP,
PTB, PR e de parte do PMDB, hoje marcado por fissuras em torno das propostas
governistas. Votaram contrariamente à matéria PT, PDT, PSB, Rede e o
peemedebista Eduardo Braga (AM). Entre os titulares do colegiado, únicos
parlamentares com direito de voto, apenas o pessedista Lasier Martins (RS) se
absteve.
Mesmo diante da resistência da oposição, a base
aliada conseguiu ainda autorizar o caráter de urgência da tramitação e rejeitar
os três destaques (sugestões de alteração) que foram propostos.
Mudanças
Envolta em polêmicas e com ampla rejeição popular, a
reforma altera mais de 300 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Entre
as mudanças propostas, estão: prevalência do negociado sobre o legislado; fim
da assistência obrigatória do sindicato na extinção e na homologação dos
contratos; extinção do imposto sindical obrigatório; divisão das férias em até
três períodos; contrato de trabalho intermitente (modalidade de contrato de
trabalho por hora); negociação da jornada entre patrões e empregados, podendo
chegar a 12 horas em um único dia, com limite de 48 horas semanais (44 da
jornada padrão, mais quatro extras).
A reforma também possibilita que grávidas e
lactantes trabalhem em locais insalubres considerados de graus médio ou mínimo
e permite a redução do intervalo para almoço, hoje de uma hora. O contrato
temporário de trabalho deverá ter limite de 120 dias.
Alternativas
Apesar de ter tido parecer favorável do relator,
Romero Jucá (PMDB-RR), também líder do governo na Casa, a reforma recebeu seis
votos em separado, que são propostas alternativas. Todas elas foram lidas nessa
quarta, pelos senadores Lasier Martins (PSD-RS), Eduardo Braga (PMDB-AM), Paulo
Paim (PT-RS), Lídice da Mata (PSB-BA), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Randolfe
Rodrigues (Rede-AP).
De perfil mais conservador, o pessedista defendeu o
PLC, mas sugeriu alterações, enquanto todos os demais pediram a rejeição da
matéria. Entre outras coisas, Martins propôs que a contribuição sindical
obrigatória deixasse de existir dentro de quatro anos, e não de imediato.
Os pontos que alteram questões relacionadas aos
sindicatos têm sido bastante criticados pela oposição porque, ao sufocar a
atuação sindical, tenderiam a comprometer, por tabela, a garantia dos direitos
da classe trabalhadora. “Essa reforma cria insegurança jurídica e fragiliza o
ambiente das relações de trabalho”, apontou o senador Randolfe, acrescentando
que a matéria teria caráter inconstitucional.
PMDB em crise
Diante da profunda crise que ronda a figura de
Michel Temer e marcada por fissuras, a bancada do PMDB, a maior do Senado,
padece atualmente de um intenso jogo de “toma lá, dá cá” envolvendo
simpatizantes do governo e opositores. Conforme já vinha sendo anunciado, o
desgaste teve reflexo na votação da reforma trabalhista. Na CCJ, a legenda
conta com sete senadores entre os 27 titulares.
“Eu sou a favor das reformas, sou uma liberal, mas,
neste momento, usar o poder que o mercado tem hoje para fazer estas reformas
num governo que está caindo de pobre é uma vergonha imensa pra nós”, sustentou
a dissidente Kátia Abreu (PMDB-TO), que protagonizou um caloroso debate com o
líder do governo ao longo da sessão. “Temos que aprovar esta matéria porque ela
é urgente pra sociedade”, rebateu Jucá.
O senador Renan Calheiros (PMDB-AL), até pouco tempo
atrás parceiro do Planalto, agora tem estremecido a base aliada. Entre outras
coisas, ele defendeu o adiamento da votação, alegando que “o governo não tem a
confiança da população”.
Narrativa
Enquanto os governistas sustentam que a reforma
seria a “modernização da CLT” e facilitaria a contratação de trabalhadores no
mercado formal, movimentando a economia e tirando o país da crise, membros da
oposição, segmentos populares e especialistas argumentam que o discurso
consiste numa armadilha para ludibriar a classe trabalhadora porque deve
precarizar ainda mais as relações de trabalho.
“O governo tenta confundir o trabalhador e a
população de modo geral. (…) Isso é escandaloso, além de se tratar de uma
reforma inconstitucional”, criticou a senadora Lídice da Matta (PSB-BA).
Acesso
Os opositores têm se queixado, inclusive, da falta
de debate do parlamento com a sociedade a respeito da matéria. Nesta
quarta-feira (28) pela manhã, grupos sindicais e entidades da sociedade civil
organizada que se concentraram em frente ao Congresso Nacional para protestar
contra o PLC 38 foram proibidos de ingressar nas dependências do prédio.
Ainda mais restrito, o acesso à CCJ contemplou
apenas parlamentares, alguns assessores e profissionais de imprensa. A
dirigente Graça Costa, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), foi uma das
poucas representantes populares que conseguiram entrar no período da tarde. “É
um absurdo não termos acesso porque, quando eles querem o nosso voto, entram na
nossa casa, vão tomar café com a gente pra nos convencer a votar neles. (…) Os
trabalhadores não foram ouvidos lá fora nem aqui dentro. Isso é muito grave. É
luta de classe, é capital e trabalho, e o parlamento era pra ser o mediador
disso”, criticou Costa.
Transparência
Durante o debate na CCJ, os senadores Gleisi
Hoffmann (PT-PR) e Lindbergh Farias (PT-RJ) chegaram a pedir ao presidente do
colegiado, Edison Lobão (PMDB-MA), que solicitasse ao presidente Eunício a
suspensão da sessão do plenário, para que os debates e a votação na CCJ
pudessem ser transmitidos pela televisão.
“É muito grave não estarmos transmitindo esta
sessão. A TV senado é sempre muito assistida no país e esta aqui é uma matéria
de grande interesse popular”, disse Hoffmann. Os trabalhos do plenário foram
interrompidos pouco depois, evidenciando o intuito governista de evitar o
adiamento da votação na CCJ. Isso porque, conforme dita o regimento, a sessão
dos colegiados precisa ser suspensa quando se inicia a ordem do dia no plenário
da Casa.
Barganha
Durante a sessão, o senador Romero Jucá leu uma
carta de Temer direcionada aos parlamentares em que o chefe do Executivo
promete enviar uma medida provisória (MP) ao Congresso para modificar a reforma
trabalhista após a aprovação do texto.
A iniciativa tem o objetivo de evitar modificações
no PLC, que, caso sofra alterações de mérito no Senado, precisa retornar à
Câmara dos Deputados, estendendo a tramitação. A carta, que será enviada a
todos os senadores, consistiu num dos pontos de ebulição do debate no
colegiado, por se tratar de uma pressão na base aliada, dividida em torno da
matéria. “Quem acredita no Temer? O Senado não pode abrir mão de legislar por
causa de uma carta do presidente ilegítimo”, disse Fátima Bezerra (PT-RN).
A aprovação da reforma se deu sob intenso lobby
também de entidades patronais, incluindo a Confederação Nacional de Dirigentes
Lojistas (CNDL) e a União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (Unecs).
Ambas estiveram no Senado nessa terça-feira (27) para pressionar o presidente
da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), pela apreciação célere do PLC.
Sintonizado com os interesses do Planalto, o
peemedebista tem seguido ao pé da letra a cartilha governista e garante a
aprovação da reforma ainda neste semestre, ou seja, antes do recesso
parlamentar que se anuncia. Os últimos dias de votação na Casa serão na semana
do dia 10 de julho.
Números
A polêmica que circunda a proposta está traduzida
também em números: ao longo da tramitação no Senado, a reforma recebeu 686
emendas, que são sugestões de alteração no texto, tendo passado, além da CCJ,
pelas Comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Assuntos Sociais (CAS). Nesta
última, a matéria foi rejeitada por 10 votos a nove, numa inédita derrota
governista.
No Tribunal Superior do Trabalho (TST), principal
Corte trabalhista do país, 17 dos 27 magistrados se posicionaram contra o PLC
38 no mês passado, em manifesto entregue ao presidente do Senado, Eunício
Oliveira (PMDB-CE). Outra referência vem do site oficial da Casa: em enquete
virtual realizada para consultar os cidadãos, mais de 130 mil internautas
votaram contra o PLC, enquanto 5.806 se posicionaram a favor da reforma. (Do
Brasil de Fato)
Veja como votaram os senadores:
A favor da reforma
trabalhista
-
Jader Barbalho (PMDB-PA)
-
Romero Jucá (PMDB-RR)
-
Simone Tebet (PMBD-MS)
-
Valdir Raupp (PMDB-RO)
-
Marta Suplicy (PMDB-SP)
-
Paulo Bauer (PSDB-SC)
-
Antonio Anastasia (PSDB-MG)
-
José Serra (PSDB-SP)
-
Ricardo Ferraço (PSDB-ES)
-
Maria do Carmo Alves (DEM-SE)
-
Roberto Rocha (PSB-MA)
-
Benedito de Lira (PP-AL)
-
Wilder Morais (PP-GO)
-
Armando Monteiro (PTB-PE)
-
Eduardo Lopes (PRB-RJ)
-
Cidinho Santos (PR-MT)
Contra a reforma
trabalhista
-
Eduardo Braga (PMDB-AM)
-
Antonio Carlos Valadares (PSB-SE)
-
Randolfe Rodrigues (Rede-AP)
-
Jorge Viana (PT-AC)
-
José Pimentel (PT-CE)
-
Fátima Bezerra (PT-RN)
-
Gleisi Hoffmann (PT-PR)
-
Paulo Paim (PT-RS)
-
Ângela Portela (PDT-RR)
Abstenção
Lasier Martins (PSD-RS)